domingo, 15 de fevereiro de 2009

FSM: quem desmata a Amazônia?

por Eron Bezerra*

A 10ª edição do Fórum Social Mundial (FSM) acaba de ser encerrada em Belém. Da primeira edição para esta muita coisa mudou e outras, ainda, continuam iguais. É uma clara demonstração da vitalidade da dialética que nos ensina tanto que “a natureza e a sociedade se transformam e evoluem permanentemente”, como assevera que “o novo nega o velho e o velho nega o novo”.

Quando milhares de pessoas se reuniram naquela edição primeira de Porto Alegre o lema geral do FSM - “outro mundo é possível” - estava impregnado da rejeição ao capitalismo e, também, da negação ao chamado socialismo real.

O mundo de então se caracterizava por uma expansão belicista sem precedente do imperialismo americano e, ao mesmo tempo, pelo colapso do leste europeu e o fracasso da experiência soviética.

A idéia de um mundo baseado no chamado terceiro setor, ou simplesmente ONGs, era muito presente naquele tempo. Por isso, contraditoriamente, embora negassem o capitalismo como sistema, a pregação de um mundo globalizado, sem fronteiras, no qual a Amazônia seria “patrimônio da humanidade” fazia enorme sucesso na quase totalidade dos presentes naquela já distante edição.

Para contrariedade dos organizadores a presença duma minúscula “delegação” do PCdoB (não mais que 5 pessoas) impediu a unanimidade dos discursos tanto no aspecto global da Amazônia quanto da alternativa para o “o outro mundo”.

A edição de Belém encontra o mundo envolto na maior crise capitalista do século, na derrota geral do neoliberalismo na América Latina, na revitalização do projeto socialista como alternativa e no bom desempenho com que os países socialistas vêm levando adiante seus projetos nacionais de desenvolvimento. O socialismo, portanto, não é mais coisa de “dinossauro”. E essa é a mais expressiva mudança no conteúdo e no “humor” do FSM.

Mas a Amazônia continua sendo pautada como “patrimônio da humanidade”, apesar dos avanços obtidos tanto na edição de Caracas quanto nesta de Belém, ambas patrocinadas pelo PCdoB e a Fundação Mauricio Grabois.

Quem, afinal, desmata a Amazônia?

Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) a Amazônia perdeu algo como 36 milhões de hectares de floresta entre 1988 e 2008. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) trabalha com um valor maior. Dados do censo agropecuário registram que, em 2006, em torno de 2,1 milhões de trabalhadores rurais cultivavam próximo de 69,7 milhões de hectares, sendo 14,3 (20%) com lavouras temporárias e permanentes e 55,4 milhões de hectares (80%) com pastagens.
Dessa área, as culturas alimentares (arroz, feijão e mandioca), destinadas ao consumo da população local, ocupavam não mais do que 1,4 milhões de hectares, ou seja, 2% de toda a área.

Como já se viu a pecuária ocupa 80% de toda a área e a soja, sozinha, 51% de toda a área de lavoura temporária e permanente. A população local não come tanta soja e nem tampouco tanta carne. Aonde se destina essa produção? Ao sudeste do país e ao exterior, especialmente Europa e Estados Unidos, precisamente os que por outros interesses – acima já registrados – são os que mais bradam contra a ocupação da Amazônia. De nossa parte é bom não esquecer que esses são os principais produtos da nossa pauta de exportação.

* Eron Bezerra, Engenheiro Agrônomo, Professor da UFAM, Deputado Estadual Licenciado, Secretário de Agricultura do Estado do Amazonas, Membro do CC do PCdoB.

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