segunda-feira, 22 de junho de 2009

O renascimento do rábula

Por Eudes Quintino de Oliveira Júnior,
advogado (OAB-SP nº 35.453) e reitor da Unorp


A recente decisão do STF que considerou inconstitucional a obrigatoriedade de diploma para o exercício da profissão de jornalista, traz à baila uma ampla discussão a respeito de outras profissões, que a exemplo do jornalismo, não lidam com o domínio da “verdade científica”, segundo o ministro Peluso ou, como salientou o ministro Lewandowski, que o jornalismo prescinde do diploma e “requer uma sólida cultura, domínio do idioma, formação ética e fidelidade aos fatos”.

Tais requisitos são compatíveis com o direito à informação e com a liberdade profissional, dispensando o diploma superior de jornalismo. Por tal decisão, portanto, via de regra, se a profissão não exigir o conhecimento científico, será considerada inconstitucional a obrigatoriedade do diploma.

A Advocacia contou durante muito tempo com a figura do rábula. A palavra significava originariamente o mau advogado, aquele que fala muito e sabe pouco, o charlatão. Posteriormente, perdeu a significação pejorativa e passou a indicar o advogado que não era detentor de formação acadêmica, mas, em razão de seu saber teórico e de seus conhecimentos práticos, tinha autorização para pleitear judicialmente, na primeira instância.

O rábula contribuiu e muito para o engrandecimento da classe dos advogados e contou com grandes nomes, dentre eles Antonio Evaristo de Morais, eloquente orador, jurista de primeira água e fundador da Associação Brasileira de Imprensa, em 1908. Posteriormente, cursou a faculdade de direito e colou grau com 45 anos de idade.

O Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil excluiu definitivamente a figura do rábula no Direito pátrio. Mas a decisão da mais alta corte do país pode decretar o renascimento desta mitológica figura, pois, a exemplo do curso de jornalismo, a formação acadêmica do estudante de Direito não lida com verdades científicas. Assim, em tese, a pessoa que tivesse o exemplar domínio do idioma e uma cultura invejável, além dos componentes da ética e do bom nome que goza na comunidade onde serve, sem ter cursado a faculdade de Direito, poderia se apresentar como um rábula e pleitear os direitos inerentes à advocacia.

A decisão do Supremo comporta tal interpretação, em se tratando de casos assemelhados. Assim, uma nova plêiade, que seria recrutada dentre autodidatas ou de pessoas que se destacam pelo seu saber jurídico, vem a dividir o espaço com aqueles que procuraram por uma formação profissional específica. O permissivo vai além. A Constituição Federal, quando estabelece os requisitos para a escolha de ministro para a mais alta corte de Justiça do país, elenca o notável saber jurídico e a reputação ilibada, sendo, portanto, dispensáveis a obrigatoriedade do bacharelado em Ciências Jurídicas e que os indicados sejam provenientes da magistratura.

A própria lei que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis, criou a figura do conciliador leigo como auxiliar da Justiça e também não exige, preferencialmente, que a escolha recaia entre os bacharéis em Direito.

Assim, numa projeção estribada na decisão do STF, já foi eleito o moinho da próxima cruzada. O pretendente a rábula poderá, preenchendo os requisitos do saber notável, dos atributos éticos compatíveis, habilitar-se como profissional da Advocacia e seu registro merece deferimento. As empresas, escritórios de Advocacia, órgãos públicos estabelecerão condições para que seus profissionais comprovem o curso de graduação jurídica, mas não impedirão que o rábula exerça seu trabalho em outros seguimentos. Justo jure.

(*) E-mail - eudesojr@hotmail.com

Fonte: www.espacovital.com.br

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